quarta-feira, 13 de novembro de 2013

ENTREVISTA III

Foto ilustrativa. Atelier do Boi Barroso.
ENTREVISTA III*

Você acha que o carnaval tem sido uma representação da comunidade?

“Acho que nosso carnaval é um pouco das Escolas de Samba e dos Blocos de rua do Rio de Janeiro, é um pouco da Bahia com trio elétrico, e os Blocos do Boi referem-se ao norte e nordeste, então, daqui mesmo é muito pouco.
O carnaval mais tradicional do Paraná é uma grande mistura. Ainda assim, Antonina é a cara do Paraná, é isso mesmo, um pouco de cada coisa. Então, hoje temos um carnaval que sem dúvida é muito bom, uma festa tranquila, cheia de alegria, não é aquela “festa da carne” como o nome diz, mas é o "carnaval da família", onde as pessoas podem sair nas ruas com tranquilidade, e é um carnaval diversificado, que tem de tudo.
Sábado tem desfile dos blocos e baile na rua com trio elétrico, domingo tem o desfile das Escolas de Samba, mas entre 1980 e 1990 os antoninenses viraram platéia, ficavam assistindo as pessoas virem de fora com suas plumas e paetês, nos seus carros alegóricos.
Hoje não, a cidade incorporou mais as Escolas de Samba. Essas Escolas até a década de 1980 eram grandes blocos carnavalescos, depois começaram a ser formato de alas, a copiar o Rio de Janeiro, começou a ter concurso entre as escolas. Hoje o concurso acabou, mas se é Escola de Samba tem que ter concurso, senão é como ter time de futebol e não participar de campeonato parece uma coisa estranha.
No caso dos blocos carnavalescos, principalmente no caso do Boi do Norte que é mais tradicional, eles sempre foram uma manifestação mais simples e espontânea possivelmente trazida por algum trabalhador, algum estivador do norte ou nordeste do Brasil que veio para cá e montou o grupo, não tenho esse dado. Então, são sempre pessoas simples com seus ornamentos de acordo com a sua cultura, a sua simplicidade, e que faziam do momento do carnaval a sua festa, a sua alegria. Sempre fui a favor, tentei defender – em um determinado momento - um espaço para que essas pessoas continuassem tendo o espaço delas, em detrimento das Escolas de Samba que cresceram e “viraram luxo”, enquanto os blocos “viraram lixo”.
Quando as Escolas de Samba ganharam alas e carros alegóricos, houve um choque de comportamento, de identidade, de fantasias. É um choque mesmo colocar a Escola da Capela, por exemplo, ao lado do Bloco do Boi. E nos últimos anos, esses blocos também estão se transformando em alas. O que acho mais preocupante ainda, além dessa transformação de Blocos em Escolas de Samba, é a maneira como eles interagem com a população no dia do carnaval. A minha concepção de Bloco é que há uma interação com a comunidade, a qual vai atrás, vai junto...Participa da “coreografia espontânea”, não é uma platéia. Espetáculo é Escola de Samba, tem um sambódromo, um grande teatro ao ar livre, tem horário, coreografias, baterias, e você aprecia o espetáculo.
O Bloco é uma folia comunitária, uma catarse, onde todos participam. O Bloco do Boi é maravilhoso, antes o boi saia feito “um louco” atrás da criançada, mas hoje não, cercam a avenida e fazem aquela apresentação triste, é um boi triste.
Nova eles vêm perdendo identidade, o encontro com a população envolvente.
Os participantes, principalmente no caso do Boi do Norte que é mais tradicional, fazem essa simbiose com a comunidade, são eles que chamam a comunidade para participar, mas quando colocaram a cerca, virou desfile.
Posso estar enganado, mas é a minha concepção. Antigamente os blocos brincavam livremente, não havia desfile nem horários rígidos.
Mudanças aconteceram, acho que os organizadores, as autoridades responsáveis pela festa, se preocupam demais com a organização do evento. É claro que deve ter infraestrutura, segurança, recursos, mas determinadas situações não precisam ser organizadas, e não existe um debate aberto com a sociedade, que com certeza contribuiria para ajustar algumas deficiências”.

Continua na próxima semana...


*entrevista com Eduardo Nascimento (Bó) concedida a Beatriz Helena Furianetto (doutoranda da UFPR) 18-05-2013

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